"A jornada rumo à totalidade não é algo que se possa fazer da noite para o dia. É uma dança composta de vários passos, com muitos parceiros, muitas voltas e rodopios, muitas músicas, muitos estilos. Ela é imprevisível. E leva tanto tempo quanto for necessário."

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Amor: ainda pode dar certo!



Por Daniel Jordão

Queridas deusas e amigas especiais  hoje temos um post especial que fala de diferentes formas de amor.
Palavra essa retratada por artistas, enfeitada por poetas, discutida por filósofos, enfim vamos debruçar nosso tempo para saber um pouco mais.

"As palavras seguintes, em grego, são Pathé e Mania. Ovídio escreveu “ A Arte de Amar” que é a arte de evitar tornar-se amoroso. Porque para os antigos gregos e romanos, estar amoroso é uma doença. É uma possessão. “A Arte de Amar” de Ovídio é a arte de evitar cair neste estado de possessão.


Traduzimos a palavra Pathé por paixão e ela está na origem da palavra Patologia. É interessante verificar que, na tradição grega, algumas formas de amor são formas de patologia, são formas de possessão, de Mania, como por exemplo: maníaco-depressivo. A paixão faz-nos passar por estados extraordinários, maravilhosos, mas pode ser também um inferno, pelo ciúme que desencadeia.

Este amor não é de consumo, não é um amor devorador, mas é um amor de posse, de dependência e também de necessidade. Aqui, o amor não é um dom, é uma necessidade, uma solicitação. Às vezes, o que chamamos de amor não é senão posse, dependência, necessidade. Esta forma de amor é uma forma de sofrimento.

Na cultura ocidental, pelo número de canções e de romances tristes que ouvimos e lemos, temos a impressão de que não existe amor feliz. Todas as histórias de amor são, ao mesmo tempo, histórias apaixonadas, possessivas, ciumentas e, freqüentemente, dolorosas.


Depois vem a palavra Éros, que expressa não somente um amor de solicitação e necessidade, mas também de desejo. Éros é um jovem deus. É ele que dá asas ao nosso falo, à nossa necessidade e à nossa libido. Éros  é já uma forma muito evoluída de amor. Não estamos mais no consumo que caracteriza a criança, em possessão, dependência, solicitação e necessidade que caracterizam a criança e o adolescente, mas começamos a viver uma sexualidade adulta. Um amor de uma pessoa por outra, desejando-a e maravilhando-se com ela.

Para Platão, Éros é o amor da beleza, o amor da grandeza que nos falta. Já falamos do pé alado. Pois bem, Éros é o sexo alado, o sexo que encontra suas asas. E, atualmente, a palavra Éros está muito próxima da palavra Pornéia.

A palavra Storgué pode ser traduzida como ternura e Harmonia que é uma palavra muito bonita para falar de amor. É uma maneira de harmonizar o seu ser com o ser do outro. Sri Aurobindo dizia que os problemas entre os seres humanos são problemas de ritmo. Nós não vivemos no mesmo ritmo. É uma experiência muito bela harmonizar sua respiração ( seu Sopro), com a respiração do outro.

Esta harmonia entre duas pessoas tem como conseqüência uma cura da terra. Os antigos chineses diziam que, da harmonia entre o homem e a mulher, da harmonia  entre os dois seres, depende a harmonia do Universo. Não estamos mais ao nível da necessidade, da paixão, nem mesmo do desejo. Estamos no mundo da harmonia e, pouco a pouco, nos aproximamos da compaixão.

Chegamos à palavra Philia que é muito interessante. Vocês a encontram em Filosofia _ o amor à sabedoria -, Em Filantropia – o amor aos seres humanos. Em grego, distinguem-se diferentes formas de Philia.

A Philia Physiqué é o amor parental, a amizade entre parentes. O amor da mãe ou do pai pela sua criança e vice-versa. É, igualmente, o amor entre irmãos. Este, às vezes, é um amor difícil, porque a inveja, a concorrência vem tudo destruir, mas, como diz Rousseau, “um irmão é um amigo que a natureza nos dá”. Esta é uma forma de relação muito preciosa.

Philia Zeiniqué é o amor da hospitalidade, o respeito aos outros, o respeito por aqueles a que se recebe. Temos aqui uma qualidade de relacionamento que é diferente das relações familiares. Não há a mesma familiaridade, mas pode haver a mesma profundidade e pode mesmo ser mais profundo. Temos amigos com quem temos relações mais íntimas que com nossos irmãos, irmãs e pais.

A Philia Etairiqué é o verdadeiro amor-amizade, entre dois Egos, duas pessoas. É  o amor do dar e do receber, uma relação de confiança ajuda, parceria.E diz o provérbio que aquele que tem um amigo é mais rico que aquele que tem um reino. Porque podemos viver com este amigo o que temos de mais humano.

A Philia Erotiqué é também uma amizade, um amor com respeito um amor que respeita a liberdade do outro, é uma espécie de amizade-amorosa. Não é muito fácil de entender porque não é paixão, não é dependência, mas há uma qualidade de ternura, de harmonia, de grande respeito e atração que faz dela uma amizade muito profunda.


Disse-lhes que, às vezes, misturamos as formas de amor. Quando a Philia Psiqué se mistura com a Philia Erotiqué, há uma forma de incesto. Quando a Philia Zeiniqué, se confiunde com a Philia Erotiqué, esquece-se o respeito, a distância que se deve àquele a quem se recebe como  um hóspede. Não podemos exigir do hóspede uma intimidade que supõem um conhecimento maior, com partilha do seu espírito e do seu psiquismo, ou mesmo com manifestações ao nível do corpo.

Há ainda outras palavras para designar o amor. A palavra Énnoia quer dizer o dom , a doação e, às vezes, o devotamento. É  uma qualidade de amor que manifesta uma grande generosidade do coração. É a libido, a energia vital que se manifesta ao nível do coração.

Kháris  significa gratidão. Ter gratidão pela existência do outro. Agradecer ao outro porque ele existe e maravilhar-se pela sua existência. Não sei se alguma vez já lhes agradeceram porque vocês existem. Ë um grande presente. E freqüentemente, uns com os outros, faltamos com a gratidão.Vivemos na ingratidão. Não sabemos reconhecer as doações que nos são feitas. Somos como grandes bebês a quem tudo é devido, tudo é normal.

Finalmente, chegamos à última palavra desse vocabulário grego, Ágape. Podemos traduzi-la como a graça ou a gratuidade. Ambas têm a mesma etimologia. É esta gratuidade do amor em que se ama por nada, por causa de nada. Não sei se vocês viveram  esta experiência: amar sem ter nada de particular para amar. Amar não a partir de sua carência, mas amar a partir de sua plenitude. Amar não somente a partir de sua sede, mas amar a partir de sua fonte, de sua fonte que corre.

A palavra amor tem sentidos bem diferentes. Não é preciso opô-lo uns aos outros. Há uma criança que tem fome e sede, um adolescente que pede para ser reconhecido, nomeado, chamado. Não podemos esquecer o desejo que nos habita. Somos igualmente capazes de harmonia e de ternura e seria uma lástima nos privarmos da amizade, desta troca, deste partilhar, desta capacidade de doação e de perdão que habita em nós. E devemos fazer também a experiência do que há de graça, de gratidão e de gratuidade em nós. Fazermos a experiência de Deus em nosso interior.”


Fragmento de: O Corpo e Seus Símbolos: Uma Antropologia Essencial , Editora Vozes,    de  Jean-Yves Leloup, cristão ortodoxo, fundador do instituto para o encontro e o Estudo das Civilizações e do Colégio Internacional dos terapeutas.

Traduziu e comentou também os evangelhos apócrifos de Tomé e Maria Madalena.
                   
 Abraço a todos